CENTRO DE DESENVOLVIMENTO DA OCDE
Relatório final sobre a conferência "Parceria Público-Privada em Moçambique" realizada em Maputo no dia 1 de Outubro de 2002
por
Francisco Mantero
e
Nuno Santos
Realizada no quadro do Projecto Piloto PPP MOZ
Dezembro de 2002
Índice
Sumário
...3Introdução
..5Conclusões
.7Sessão de abertura
.9Sessão 1: Evolução da Economia Moçambicana
. ..10Parte 1: Indicador Composto de Actividade Económica (ICAE) .. ..10
Parte 2: African Economic Outlook (AEO) .. ..21
Debate . .. ..27
Sessão 2: Formas Inovadoras de Financiamento
...29Parte 1: ER/ACT Recuperação Económica das cheias .. .. ..31
Parte 2: Esquema de Garantia de Empréstimos na Zâmbia ..38
Debate . .. ..46
Sessão 3: Dois Casos de Actividade Económica em Moçambique
48Parte 1: O Algodão .. .. 49
Parte 2: O Cajú ..55
Comentários . .. 62
Debate . .. ..64
Sessão de encerramento
67Trabalhos preparatórios e de pós conferência
. ...68Referências
.. 73
Sumário |
O objectivo principal do projecto piloto Parceria Público-Privada em Moçambique (PPP MOZ) foi o de disseminar informação, entretanto colhida e trabalhada, sobre a economia moçambicana. Com essa disseminação pretendeu-se facilitar a criação de uma Parceria Público-Privada (PPP) no sentido de apoiar o Governo, o sector privado e todos os outros parceiros económicos para que possam ser os "proprietários" das políticas mais adequadas ao desenvolvimento do seu país.
A conferência final do projecto teve lugar em Maputo no dia 1 de Outubro de 2002 e juntou 107 pessoas representantes do sector público e privado moçambicanos, bem como de organizações internacionais e outros altos funcionários da administração do país. A conferência foi dividida em 3 sessões que trataram respectivamente os temas de "Evolução da Economia Moçambicana", "Formas Inovadoras de Financiamento" e "Dois Casos de Actividade Económica em Moçambique". As apresentações e discussões (i) salientaram a importância do conhecimento da economia e da sua "propriedade" por parte das instituições moçambicanas como importantes factores de apoio à tomada de decisões públicas e privadas, (ii) ajudaram a promover as PPP como plataforma para a formulação de políticas que melhorem as capacidades de negociação internacional do país e (iii) indicaram a necessidade de criar mecanismos inovadores de financiamento do desenvolvimento.
Na primeira sessão da conferência, foi dada uma particular atenção á necessidade de reconsiderar os tipos de indicadores usados para monitorizar a evolução cíclica da actividade económica em países em desenvolvimento e para promover as capacidades das instituições africanas transferindo progressivamente para elas a execução e a gestão de projectos como o African Economic Outlook. A apresentação de um indicador composto de actividade económica em Moçambique (ICAE) deu uma nova perspectiva na evolução recente da economia moçambicana e da sua correlação com a conjuntura da África do Sul.
A segunda sessão focalizou-se na importância da criação de formas inovadoras de financiamento para ultrapassar a exclusão financeira, especialmente nas áreas rurais. A apresentação do esquema de garantias de empréstimos de US$ 25 milhões da USAID com o objectivo de ajudar o financiamento da recuperação económica do país após as cheias de 2000, mostrou os benefícios resultantes de se ter desenhado um projecto baseado numa PPP, especialmente através do aumento da transparência e eficácia da operação.
A terceira sessão, através da apresentação e discussão dos casos do algodão e do cajú, levantou a questão do desafio que representa melhorar a competividade de Moçambique à escala global e regional. Foram considerados aspectos fundamentais para o efeito : a definição de estratégias sectoriais a longo prazo, uma mais eficiente e competitiva gestão das infraestruturas dos transportes e a revisão de alguns pontos da legislação laboral. Por outro lado, ambos os casos mostraram como a falta de conhecimento e de diálogo público-privado conduziu a decisões de políticas ineficientes com consequências severas para a economia do país e a sua população. Foi também reconhecida a necessidade de uma maior coordenação de esforços entre o sector público e o privado na defesa internacional dos interesses de Moçambique.
Introdução |
A ideia da conferência PPP MOZ assentou, em primeiro lugar, no reconhecimento da importante necessidade de disseminar pelos intervenientes do diálogo social em Moçambique a informação elaborada pelos vários parceiros do desenvolvimento do país. Em segundo lugar, na necessidade de um debate inicial, como intróito, para se avançar na institucionalização de uma parceria público-privada (PPP) em Moçambique que tenha como objectivo contribuir sistematicamente para assegurar que as políticas para o desenvolvimento económico e social do país sejam as mais correctas.
As PPP inserem-se num novo paradigma de desenvolvimento com base na promoção do bem comum, sendo o seu objectivo a prazo melhorar o ambiente para a actividade económica nos países em desenvolvimento, alargando e aprofundando a base de conhecimentos para o diálogo entre o sector empresarial, os sindicatos e a administração pública. Estes objectivos foram enquadrados em políticas adequadas à sua prossecução a nível nacional e global na Declaração de Monterrey (nomeadamente no seu parágrafo 24), adoptada na Conferência Internacional sobre o Financiamento do Desenvolvimento promovida pelas Nações Unidas e realizada em Março de 2002.
Com efeito, um ambiente mais propício ao funcionamento das empresas, a confiança entre todos os agentes económicos e sociais e uma coerência de acção dos financiadores do desenvolvimento facilitam o alcançar dos objectivos de erradicação da pobreza constantes da Declaração do Milénio, adoptada pelas Nações Unidas segundo perspectivas originalmente traçadas pelo Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE.
Nesse sentido, é importante que os dados e informações sejam desenvolvidos por instâncias locais e não exclusivamente fornecidos por organismos externos, para que os sectores privado e público locais possam sentir que detêm a "propriedade" dos conhecimentos que servem de base para as suas deliberações. As vantages da "propriedade" não obstam a que seja também essencial assegurar que as políticas desenvolvidas e aplicadas tenham mérito técnico e económico. É que só assim as economias em desenvolvimento poderão atrair os investimentos e apoios externos privados e públicos, bilaterais e multilaterais, normalmente indispensáveis para o êxito do esforço local.
Para implementar o seu projecto piloto sobre PPP para o desenvolvimento, o Centro de Desenvolvimento da OCDE (DEV) escolheu Moçambique, apoiando a preparação do ICAE. Este índice abre novas perspectivas sobre as tendências de curto e médio prazo da economia moçambicana e constitui um "benchmark" doméstico para outras estatísticas e previsões, a grande maioria das quais associadas a missões das instituições de Bretton-Woods.
Este instrumento técnico foi apresentado na primeira sessão da referida conferência pelo seu autor, o macro-economista moçambicano Professor Roberto Tibana, que contou para a sua elaboração com o apoio de técnicos da OCDE e do Banco de Portugal. De forma a enquadrar a evolução da economia moçambicana no contexto internacional seguiu-se uma apresentação pelo Presidente do DEV, Professor Jorge Braga de Macedo, do African Economic Outlook, uma edição conjunta do Banco Africano de Desenvolvimento e da OCDE,.
Respeitando o espírito do projecto, a conferência procurou outras areas onde as PPP fossem vantajosas para além do ICAE. Para o efeito foram escolhidos os casos concretos dos sectores do algodão e do cajú, bem como formas inovadoras de financiamento do desenvolvimento. Foram salientadas as consequências de algumas políticas anteriores aplicadas a estes sectores relevantes da economia e levantou-se a questão da eficiência do mercado financeiro local, das suas capacidades e limitações no financiamento das empresas.
Na segunda sessão da conferência, a Dra. Christine de Voest , representante da USAID, apresentou os resultados do programa "Emergency Reconstruction Agricultural, Commercial and Trading Program Loan Activity" e o Dr. Nuno Santos, do DEV, expôs o caso da Zâmbia, país onde o Programa de Desenvolvimento do Sector Privado da União Europeia garante empréstimos através de esquemas inovadores montados com a banca comercial local.
Na terceira sessão, especialistas moçambicanos apresentaram e comentaram os referidos casos do algodão e cajú. O caso do algodão foi apresentado pelo Engenheiro Carlos Henriques, ex-Presidente da Associacão Algodoeira de Moçambique e comentado pelo Dr. António Almeida Matos, Presidente do Conselho de Admimistração da Sociedade Austral de Desenvolvimento , tendo o caso do cajú sido apresentado pelo Senhor Kekobad Patel, Presidente da AICAJÚ Associacão dos Industriais do Cajú de Moçambique e comentado pelo técnico da Deloitte & Touche/Mozambique, Dr. António Carvalho Neves.
Conclusões |
Os participantes concluiram sobre a importância de se institucionalizar uma PPP em Moçambique de modo a que o diálogo social baseado num conhecimento da economia mais alargado e aprofundado possa ajudar a melhorar a competitividade do sector privado e assim melhorar também as condições de vida das populações. Esta institucionalização contribuiria para promover um sentimento de mútua confiança e responsabilização de todas as partes envolvidas. Para se alcançar esse propósito é importante (i ) assegurar uma boa corrente de informação entre os sectores público e privado, (ii) aplicar políticas coerentes e transparentes e (iii) avaliar regularmente os resultados do diálogo público-privado. A transferência progressiva de projectos como o African Economic Outlook (AEO) para economistas africanos através da criação de uma rede de especialistas e o fomento de programas de formação adequados, aumentariam a capacidade das instituições africanas para desenvolverem localmente os programas mais eficientes para o desenvolvimento dos seus países. O AEO também fornece informação sobre o sucesso da iniciativa HIPC para a redução da pobreza e o desenvolvimento inicial da iniciativa NEPAD.
Principais conclusões:
Sessão de abertura |
Foi presidida por S.E. o Ministro da Indústria e Comércio, Eng. Carlos Morgado, em representação de S.E. o Primeiro-Ministro, Dr. Pascoal Mocumbi. O Eng. Carlos Morgado esteve presente durante todo o tempo que durou a conferência. Após o Dr. Elísio Langa, Secretário Executivo da Comissão de Acompanhamento ter dado as boas vindas e agradecido a presença de S.E. o Ministro, tomou a palavra o Dr. Mário Machungo, Presidente da Comissão de Acompanhamento, que começou por descrever o projecto piloto PPP MOZ. Tendo de seguida mencionado os seguintes pontos:
Seguidamente usou da palavra S.E. o Ministro Carlos Morgado que referiu na sua alocução:
Finalmente agradeceu à OCDE e a todos os membros da Comissão de Acompanhamento o trabalho feito em prol da economia moçambicana no âmbito do PPP MOZ, esperando que este projecto piloto não se esgote no termo desta conferência.
Sessão 1 |
Evolução da Economia Moçambicana
A primeira sessão da conferência PPP MOZ foi dedicada à discussão da economia de Moçambique, suas tendências e evolução.
O bom conhecimento da estrutura de uma economia, bem como da sua conjuntura de curto e médio prazo é fundamental, não só para a coordenação da política económica de um país, mas também para a tomada de decisões dos agentes económicos e dos investidores. A informação de qualidade sobre a situação e evolução de uma economia cria, além disso, bases para alargar e aprofundar o diálogo entre os parceiros sociais permitindo-lhes melhor definirem e alcançarem o bem comum. A qualidade deste tipo de informação é ainda essencial para a melhoria e consolidação do clima de confiança que deverá existir entre eles e uma importante contribuição para a desejada coerência de polítidas por parte dos financiadores do desenvolvimento.
Parte 1: Indicador composto de actividade económica em Moçambique (ICAE)
apresentado pelo Professor Roberto Tibana.
O conteúdo da apresentação do Professor Roberto Tibana incluiu :
ICAE : origem, definição e objectivos
O ICAE é uma medida das direcções de curto a médio prazo e da intensidade e variação da actividade económica no país. É uma medida de ciclos à volta da tendência de longo prazo no crescimento da actividade económica.
Contexto para a criação dum ICAE em Moçambique
O Professor Roberto Tibana começou por referir-se aos antecedentes da construção do ICAE salientando o seguinte :
Experiências de outros países
Existem hoje em dia várias experiências a nível internacional de construção de indicadores compostos de actividade económica. Estes têm geralmente por base uma mistura de dados quantitativos e qualitativos colhidos através de diferentes meios, incluindo inquéritos acerca da actividade económica e expectativas de negócio. Estes trabalhos têm como principal objectivo gerar com eficácia em termos de custos, informação atempada acerca do desempenho esperado da economia no curto e médio prazo.
Foram várias as experiências que inspiraram a construção do ICAE Moçambique, tendo o Professor Roberto Tibana mencionado em especial :
Objectivos
O Professor Roberto Tibana resumiu os principais objectivos do seu estudo como sendo :
A construção do ICAE Moçambique
O ICAE enquadra-se na categoria de indicadores que caracterizam ciclos de actividade económica. Os procedimentos seguidos pelo Professor Roberto Tibana resultam de experiências noutros países e constituem uma primeira tentativa de aplicar os métodos e técnicas de estudo dos ciclos de actividade económica à análise do desempenho de curto e médio prazos da economia moçambicana. Tomando em consideração as limitações em volume e qualidade dos dados estatísticos necessários, o autor procurou soluções alternativas que enriquecessem aquelas experiências.
Metodologia
O Professor Roberto Tibana passou em revista algumas das referências literárias que contêm os príncipios metodológicos do trabalho realizado, entre as quais se destaca o trabalho de revisão do indicador coincidente usado pelo Departamento de Comércio dos Estados Unidos. Neste processo desenvolveu-se um modelo probabilístico para a construção de indicadores coincidentes trazendo uma nova e complementar interpretação deste tipo de indicadores. Esta parte do pressuposto de que séries económicas individuais separadamente reflectem a evolução de aspectos específicos da realidade económica, e por isso, por si só não caracterizam os ciclos de actividade económica. O propósito do indicador composto é o de sintetizar a informação contida num grupo de séries temporais que preenchem determinadas condições. Assim, o indicador composto, reflecte essencialmente movimentos simultâneos em séries macro-económicas que são determinados por uma única variável não observável e comum a todas elas a que se chamou "estado da economia".
O Professor Roberto Tibana, explicou de seguida que o processo de construção do índice seguiu as várias etapas abaixo indicadas na figura 1.
Figura 1 : Etapas na construção do ICAE Moçambique |
Passo 1 |
Ajustamento sazonal das séries originais, tratamento de observações extraordinárias e das mudanças de regime (quebras estruturais), separação da componente irregular, e obtenção da componente de tendência-ciclo; |
Passo 2 |
Obtenção da componente de tendência de longo prazo; |
Passo 3 |
Computação das séries cíclicas individuais como desvios da componente de tendência-ciclico da tendência de longo prazo, na forma de rácio ; |
Passo 4 |
Normalização dos indicadores cíclicos individuais; |
Passo 5 |
Agregação das séries componentes no indicador composto |
Fonte : Roberto J. Tibana
Informação contida no ICAE
A versão actual do ICAE cobre um período de onze anos (de Janeiro de 1991 a Dezembro de 2001) e é baseada na combinação de seis séries consideradas representativas das tendências da actividade económica no país. Estas foram escolhidas na medida em que registam as actividades e os fluxos de sectores chave, processando os produtos e/ou facilitando o funcionamento de quase todos os restantes sectores da economia.
O conjunto das séries componentes inclui:
Nos exercícios de previsão, cujos resultados foram apresentados pelo Professor Roberto Tibana, foram usadas algumas variáveis financeiras como indicadores avançados potenciais. Estas variáveis incluem as taxas de câmbio, taxas de juro e o capital flutuante que, no entanto, não foram incorporadas directamente na versão corrente do ICAE. O Professor Roberto Tibana admitiu que a escolha das séries a incluir no ICAE poderá ser alvo de discussão mas considerou que com esta escolha se conseguiu de certa forma "cercar" a economia nacional. Algumas das razões que apresentou foram as seguintes:
Limitações em termos de dados
O Professor Roberto Tibana afirmou que existem uma série de dimensões em que as estatísticas das séries temporais das economias de países como Moçambique podem apresentar limitações para o tipo de estudo que realizou :
As características da informação disponível dificultam a construção de um indicador de actividade. No entanto, quanto maior o grau de concentração da economia, mais facilmente se tem uma boa aproximação de toda a estrutura económica, após se terem tomado em consideração as actividades económicas principais. No fundo, a pequena dimensão e a simplicidade da economia facilitam a utilização desta metodologia de análise do comportamento cíclico da economia.
Conclusões
O Professor Tibana concluiu a sua intervenção frisando a importância do ICAE como instrumento de conhecimento e apresentou as suas previsões da evolução de economia moçambicana para o período de Janeiro a Junho de 2002 (figura 2). O ICAE melhorado e regularmente actualizado de forma a dar previsões atempadas da evolução da economia moçambicana é um instrumento de grande utilidade para o sector privado. Um melhor conhecimento e previsão da variação cíclica da economia moçambicana é também muito útil para a administração pública e para instituições internacionais de apoio ao desenvolvimento.
Figura 2 : ICAE e previsões dinâmicas até Junho de 2002 |
Fonte : Roberto J. Tibana
O ICAE como instrumento de conhecimento
O Professor Roberto Tibana salientou os seguintes resultados obtidos através da observação da evolução do ICAE :
Figura 3 : Série das Exportações |
|
Fonte : Roberto J. Tibana
Figura 5 : ICAE e PIB anual em Moçambique e África do Sul |
Fonte : Roberto J. Tibana
Previsões ICAE sobre a evolução da economia moçambicana até Junho 2002
Para as referidas previsões, de Janeiro a Junho de 2002, foram usados os mesmos parâmetros do modelo calculado para o período até Dezembro de 2001 e os valores das principais variáveis financeiras observadas até Junho de 2002 (figura 2).
Os resultados das previsões indicam o seguinte:
Parte 2:
African Economic Outlook (AEO)apresentado pelo Professor Jorge Braga de Macedo, Presidente do Centro de Desenvolvimento da OCDE.
A apresentação do Professor Braga de Macedo incluiu os seguintes tópicos:
Discussão sobre a racionalidade e especificidade do AEO
O AEO é uma publicação conjunta do DEV e do Banco Africano de Desenvolvimento que procura dar uma visão comparativa da evolução económica e política do continente africano. Com o apoio da Comissão Europeia, este produto foi lançado em Fevereiro de 2002 na presença do Presidente Wade do Senegal. O AEO é considerado uma importante contribuição ao trabalho conjunto entre a OCDE e o NEPAD.
O Professor Braga de Macedo informou, no início da sua apresentação, que o Professor Roberto Tibana vai contribuir para a nota sobre Moçambique a incluir na próxima edição do AEO (Fevereiro de 2003) e que a secção sobre Moçambique incluirá também o ICAE bem como indicações da sua utilidade para Parcerias Público-Privadas.
Porquê um AEO?
O Professor Braga de Macedo indicou como duas principais razões para a criação desta publicação:
Especificidade do AEO
Entre os elementos que constituem a especificidade desta publicação, o Professor Braga de Macedo destacou:
Perspectivas sobre o crescimento económico em Moçambique
Crescimento económico no contexto da África Austral
O Professor Braga de Macedo começou por ilustrar o facto da economia moçambicana ter sido uma das que registou maior crescimento económico no grupo de países da África Austral desde 1995 (figura 6).
Figura 6 : Crescimento comparativo na África Austral (crescimento do PIB real) |
Fonte : AEO
O padrão de crescimento de Moçambique desde 1995 foi interpretado como sendo o resultado dos seguintes principais eventos:
Determinantes do Investimento Directo Estrangeiro (IDE)
O IDE em Moçambique teve como principais determinantes os seguintes elementos:
Através deste conjunto de factores, Moçambique foi capaz nos últimos anos de absorver grande parte do IDE canalizado para a zona da África Austral. Em termos percentuais, em 2001, Moçambique recebeu 64% do total de aproximadamente US$ 400 milhões de IDE na região (figura 7).
Figura 7 : Moçambique: percentagem do IDE total para a África Austral* |
* IDE no Zimbabwe, Zâmbia, Botswana, Moçambique, Mauricias
Fonte : AEO
Mega-projectos têm impacto significativo no crescimento económico
De acordo com um estudo realizado como parte dum projecto de assistência ao Gabinete de Estudos do Ministério do Plano e Finanças, o grupo de projectos de envergadura realizados em Moçambique terá um impacto importante na economia moçambicana que se estima chegar a um máximo de 24% em 2005. Os grandes projectos referidos são o projecto hidroeléctrico de Cahora Bassa, a produção de alumínio Mozal, o projecto de gás natural, o "corridor sands" e o projecto de ferro e aço de Maputo.
Figura 8 : Mega-projectos em Moçambique (impacto em % no PIB) |
Mega-projectos |
2000 |
2001 |
2002 |
2003 |
2004 |
2005 |
Hidroeléctrico de Cahora Bassa |
1% |
2% |
2% |
2% |
2% |
2% |
Alumínio Mozal |
2% |
5% |
6% |
8% |
10% |
10% |
"Corridor Sands" |
0% |
2% |
2% |
|||
Gás Natural |
1% |
1% |
0% |
6% |
5% |
|
Ferro e Aço de Maputo |
0% |
1% |
3% |
5% |
5% |
|
Total |
3% |
8% |
10% |
13% |
23% |
24% |
Fonte : Per-Ǻke Andersson, 2002
Apesar do efeito claramente positivo destes projectos (figura 8), o Professor Braga de Macedo alertou no entanto para o facto destas estimativas serem demasiado optimistas e de terem um impacto limitado em termos do número de empregos que criam directamente.
Conclusões
O Professor Braga de Macedo concluiu a sua apresentação com dois principais resultados da análise efectuada no contexto do AEO:
Sessão 1 Debate |
O debate iniciou-se com um grupo de perguntas acerca das variáveis que foram escolhidas para integrar o ICAE. O Dr. António Almeida Matos colocou a questão das razões da escolha das variáveis do transporte de mercadorias e produção de cimento, enquanto a Dra. Virginia Videira, deputada e representante da Assembleia da República de Moçambique, se inquietou com a ausência de uma variável que representasse o sector agrícola moçambicano dado o peso que tem na economia do país. O empresário moçambicano, Dr. Bruno Morgado, comentou que o ICAE partia de um conceito sobretudo macroeconómico e que se deveria de certa forma incorporar também uma visão microeconómica.
Em resposta o Professor Roberto Tibana afirmou que o transporte é um problema muito sério. Acrescentou que se tem verificado em Moçambique uma progressiva transferência do transporte ferroviário para o rodoviário, mas que dada a falta de colaboração de certos operadores no sentido de fornecer informação de qualidade, teve de limitar os dados utilizados aos obtidos junto dos Caminhos de Ferro Moçambicanos. No futuro será necessário que o ICAE inclua informação sobre todas as empresas de transporte do país. Quanto ao interesse de incorporar a variável cimento, a ideia foi a de medir a actividade da indústria nacional a partir do consumo interno e das exportações deste produto.
O Professor Roberto Tibana reconheceu ser verdade não existir no ICAE nenhuma série puramente dedicada à agricultura e que esse trabalho terá de ser realizado. Lembrou, no entanto, que há muitas dificuldades para alcançar esse objectivo devido à falta de dados de qualidade e à escolha da metodologia a utilizar para construir uma série exclusiva capaz de captar toda a actividade desse sector. Apesar disto, a agricultura está de certa forma incluída no ICAE dado que alguns produtos deste sector estão entre as maiores exportações do país. Em resposta à questão levantada pelo Dr. Bruno Morgado, o Professor Braga de Macedo argumentou que no ICAE existe uma relação entre variáveis macroeconómicas à actividade das empresas, nomeadamente a ligação das variáveis financeiras com as variáveis do sector real.
Um segundo conjunto de perguntas focalizou-se na questão dos limites dos indicadores actualmente disponíveis como medidas do aumento da riqueza e qualidade de vida das pessoas nos países em desenvolvimento. O Dr. António Souto, Presidente do Conselho de Administração da instituição financeira moçambicana GAPI, disse que o aumento substancial do PIB moçambicano em virtude dos mega-projectos não se traduziu na melhoria de vida do povo de Moçambique. Acrescentou que é necessário perceber como o referido aumento do PIB irá beneficiar os moçambicanos nomeadamente no aumento de emprego, na criação de novas pequenas e médias empresas e numa distribuição mais equitativa dos rendimentos. O Sr. Austin Muneku da Zambia Congress of Trade Unions e representante do TUAC na conferência, quis saber como é que se deduz do ICAE que na prática há uma melhoria das condições de vida em Moçambique, nomeadamente um aumento da criação de emprego. Finalmente o Dr. Bruno Morgado perguntou como é que o ICAE pode contribuir para a actividade das empresas.
O Professor Braga de Macedo reconheceu, citando o trabalho realizado pelo consultor Per-Ǻke Andersson, que de facto o impacto dos mega-projectos a nível de criação de emprego directo foi muito pequeno (5,000 pessoas). Porém, acrescentou que pode ter havido criação de emprego indirecto ao nível de pequenas, médias e mesmo micro empresas. Em relação à utilização do PIB como indicador de crescimento económico, afirmou que o PIB chega muito atrasado. É um instrumento de análise que discrimina contra os países em desenvolvimento porque é muito imperfeito e não tem em conta a sustentabilidade das políticas. Desta forma não se pode considerar uma chave para a compreensão da realidade destes países. Contudo, afirmou ser o ICAE, um produto de inovação analítica e constituir um importante indicador de previsão da actividade económica também ao serviço das empresas.
Finalmente a Dra. Margarida Martins da Deloitte & Touche / Moçambique quis saber quais as perspectivas futuras em relação à investigação já feita na construção do ICAE bem como quais os mecanismos que irão ser utilizados na sua actualização e divulgação.
O Professor Roberto Tibana afirmou que, quanto ao aperfeiçoamento do ICAE, a ideia é de testar novas séries reais e também procurar incluir dados qualitativos tais como inquéritos a empresas. Quanto à questão da divulgação, afirmou que é essencial fazê-la de forma acessível aos meios empresariais. Adiantou que a Comissão de Acompanhamento do projecto PPP MOZ está a pensar em várias alternativas e informou que noutros países este tipo de indicador foi sediado em associações empresariais.
Sessão 2 |
Formas Inovadoras de Financiamento
A sessão sobre formas inovadoras de financiamento inseriu-se no contexto da procura de novas soluções para os problemas de financiar o desenvolvimento económico, uma das grandes preocupações do chamado novo paradigma para o desenvolvimento. As soluções elaboradas têm por base, na maioria dos casos, a criação de Parcerias Público-Privadas de sucesso.
O grande tema das formas inovadoras de financiamento, incluiu no fundo dois sub-temas:
(i) a provisão de bens públicos ;
(ii) as questões relacionadas com as condições de financiamento do sector privado.
Tanto em países em vias de desenvolvimento como no mundo desenvolvido, o recurso a novas formas de financiar bens públicos tem ganho um papel cada vez mais importante. De facto, vários factores tais como restrições orçamentais e ganhos de eficiência com a participação do sector privado na provisão de bens públicos tem conduzido à criação de novas Parcerias Público-Privadas. Um exemplo é na construção e gestão de infra-estruturas de transporte que tem sido alvo do estabelecimento de concessões em vários países, nomeadamente na Europa, embora outros serviços como hospitais ou escolas também tenham visto aumentar o nível de "outsourcing" por parte do sector público. A questão de Parcerias Público-Privadas no caso da provisão de bens públicos é de extrema importância pois, dado o papel fundamental da partilha de riscos neste tipo de projectos são necessários elevados níveis de confiança entre parceiros públicos e privados bem como a criação de estruturas legais e de governação adequadas. Nos países em vias de desenvolvimento, estas estruturas, bem como as condições para partilhar riscos não se encontram e por isso torna-se mais difícil realizar este tipo de operações.
Em relação ao financiamento do sector privado, tem havido muita discussão no que diz respeito a questões ligadas à eficiência do sector financeiro como acessibilidade ao crédito, facilidade no processamento e condições de empréstimos. Estas questões surgem normalmente no contexto de fomentar o crescimento de pequenas, médias e micro-empresas (PMME) dado o seu importante papel na criação de emprego e no aliviar da pobreza. A sua importância resulta de uma simples observação: elas constituem o essencial do sector privado nas economias africanas. A utilização de formas inovadoras de financiamento é também objecto de discussão no caso especial de catástrofes naturais ou outras calamidades que têm um impacto substancialmente negativo na capacidade de financiamento e até no bom funcionamento do sector privado.
As formas inovadoras de financiamento normalmente mencionadas no contexto do crédito para o desenvolvimento do sector privado são os esquemas de garantia de empréstimos e o micro-crédito. Em particular, os esquemas de garantia de empréstimos têm por base, normalmente a concretização de uma parceria entre Governo, entidade guarante, sector bancário e sector privado industrial da qual depende muito do sucesso obtido. Através do esquema podem-se conseguir canalizar empréstimos para agentes do sector privado sem acesso ao crédito devido a fenómenos de racionamento de crédito ou inclusivé de exclusão financeira. Neste sentido procurou-se, no âmbito do projecto PPP MOZ, apresentar na conferência exemplos de sucesso de esquemas de garantias de empréstimos, evidenciando factores para esse sucesso, bem como limitações deste tipo de programas.
Os casos apresentados foram o programa "Emergency Reconstruction - Agriculture, Commercial and Trading" (ER/ACT) da USAID em Moçambique e um esquema de garantias de empréstimos do Programa da União Europeia para o Desenvolvimento do Sector Privado na Zâmbia.
Parte 1:
ER/ACT - Recuperação Económica Pós Cheiasapresentado pela Dra. Christine de Voest (USAID Moçambique).
O conteúdo da apresentação da Dra. Christine de Voest incluiu:
Evolução da parceria
A situação inicial a devastação causada pelas cheias do ano 2000 em Moçambique
As cheias do ano 2000 em Moçambique afectaram um número considerável de pessoas e empresas. Só nas zonas de Xai Xai e Chokwe, as avaliações de danos foram estimadas na ordem de US$ 70 milhões.
Perante este cenário devastador, para além da recuperação das infra-estruturas, era imprescindível realizar projectos com vista ao apoio ao sector privado. Foi considerado urgente a reposição das capacidades das empresas nas zonas afectadas tendo contribuido para tal a grande pressão exercida pelo sector privado e a sociedade civil.
Desta forma, no Forum Metical e na conferência de Roma, o desafio lançado aos doadores internacionais e ao Governo moçambicano foi de canalizar uma parte da assistência ao sector privado, não através de caridade, mas de instrumentos financeiros que permitissem a sua recuperação.
Elaboração do projecto as consultas com os vários interessados
O projecto do esquema de garantia de empréstimos desenhado pela USAID começou sem a confirmação do envelope financeiro que o Congresso Norte-americano iria facultar. Nessa primeira fase do projecto estabeleceram-se consultas com e entre agentes do sector privado, Governo e bancos.
A USAID considerou várias opções na elaboração da ideia inicial do projecto e embora a hipótese de um plano de crédito tenha sido a mais óbvia, julgou-se também necessário criar um mecanismo para apoiar o lado da procura através de doações para a reinstalação das famílias afectadas. Assim, o projecto assentou em apoios à procura e à oferta.
Foi também útil usar como referência soluções que se aplicam nos Estados Unidos da América onde a FEMA (Agência para a Gestão de Emergências) desenvolve programas de doações para a reinstalação de famílias que ficaram desalojadas e também facilita financiamentos a taxas de juro bonificadas para a recuperação de imóveis e empresas.
Elementos chave do projecto
Organização
Foi estabelecido um Orgão Central de Coordenação de Apoio à Reconstrução do Sector Privado para traçar os mecanismos adequados à afectação de recursos àquele sector. Este orgão foi composto por representantes do Governo, sociedade civil e doadores e simbolizou o compromisso do Governo em atender às preocupações do sector privado.
O Governo e a USAID estabeleceram um Comité do Programa para orientar as grandes linhas do projecto e autorizar os desembolsos.
Foi tomada a decisão de que o crédito seria desembolsado através do sistema financeiro comercial. A razão foi de que sendo o objectivo do projecto a recuperação económica, não faria sentido estabelecer um mecanismo de implementação paralelo. A ideia de utilizar a banca comercial foi um reconhecimento de que a actividade do programa era temporária e também uma tentativa de reduzir as distorções ao mínimo possível.
Foi seleccionada uma entidade de gestão, PMU (Program Management Unit), que faria a ponte entre o Comité do Programa e os agentes de implementação (o sector bancário). A selecção da empresa Deloitte & Touche foi efectuada através de um concurso junto de empresas Moçambicanas dado que se desejava realizar o concurso com base numa realidade local.
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Fonte : Christine de Voest
O conceito de parceria no caso do programa ER/ACT da USAID está esquematizado na figura 9. As negociações tiveram de englobar todos os intervenientes. Do lado do sector público houve dois intervenientes : o Governo de Moçambique e a USAID, tendo havido no seio destas entidades grupos de interesse divergentes (Banco de Moçambique oposto às ideias do Ministério da Indústria e Comércio e também discussões entre USAID/Washington e USAID/Moçambique). As grandes discussões foram em torno do nível de taxas de juro para os empréstimos, a escolha dos grupos-alvo dos empréstimos e a partilha de risco entre a entidade guarante e os bancos.
Acordo de crédito
Como resultado do processo negocial definiu-se um acordo de crédito que estabeleceu :
O acordo de crédito foi, no fundo, o ponto de equilíbrio dos interesses de todas as partes intervenientes. Nenhuma delas teve a possibilidade de impor o seu ponto de vista ou interesses exclusivos.
No desenrolar do programa, este acordo foi alvo de inúmeras modificações de forma a dar cobertura a novas situações que foram surgindo. Desta forma, a « negociação contínua como modus operandi» é visto como um dos principais factores de sucesso do esquema de garantia de empréstimos realizado.
Dados sobre o projecto e a sua implementação
Esquema de funcionamento do crédito
No âmbito do projecto foram transferidos 32 milhões de US$ ao Banco de Moçambique em duas tranches (Agosto e Dezembro de 2000). Foi escolhido, através de um concurso, o Banco de Comércio e Investimento (BCI) onde foi depositado o valor equivalente em moeda local numa conta remunerada à taxa mais alta oferecida no mercado.
O esquema de funcionamento do crédito está ilustrado na figura 10. As empresas elegíveis encaminhavam os pedidos para a banca que por sua vez avaliava a proposta financeira, o risco, as garantias decidindo depois se aprovava ou não o crédito. Se o crédito fosse aprovado, a banca enviava o pedido para o PMU que procedia ao registo do crédito, assegurando que o banco cumpria inteiramente com as condições do acordo. O Comité do Programa (Program Committee) então procedia à última avaliação decidindo sobre a aprovação final do envelope de créditos e ordenando ou não os desembolsos da conta do projecto acompanhada de uma carta de implementação.
Figura 10 : Esquema de Funcionamento do Crédito |
Fonte : Christine de Voest
Impacto do projecto
A componente de recuperação económica do ER/ACT chegou a exceder os US$ 32 milhões devido aos juros acumulados na conta do projecto, com as duas componentes referidas:
Na questão da atribuição de créditos a distribuição verificada foi a seguinte :
Figura 11 : Distribuição dos créditos por província |
Fonte : Christine de Voest
Figura 12 : Distribuição dos créditos por sector económico |
Fonte : Christine de Voest
Conclusões
A Dra. Christine de Voest concluiu a sua apresentação referindo algumas das lições a retirar da experiência do esquema de garantia de empréstimos da USAID. Na sua opinião os aspectos importantes foram :
Nas críticas que o projecto recebeu, a Dra. Christine de Voest salientou o facto de alguns sectores como a agricultura não terem recebido crédito no montante necessário, o facto de nem a todas as empresas afectadas pelas cheias ter sido afectado crédito e que mesmo para empresas que perderam o seu património, os bancos terem exigido garantias.
Quanto a lições para futuras Parcerias Público-Privadas, a Dra. Christine de Voest sublinhou a questão de que as condições de crédito não serão necessariamente idênticas às do ER/ACT, mas serão as que o processo negocial permitir alcançar. Por outro lado, a solução para essas novas parcerias deverá partir da base dos próprios intervenientes e não ser imposta de fora.
Parte 2: Esquema de garantia de empréstimos da Zâmbia : Lições para PPP em Moçambique
apresentado pelo Dr. Nuno Santos (Centro de Desenvolvimento da OCDE).
O conteúdo da apresentação por Dr. Nuno Santos incluiu:
Esquema de garantia de empréstimos na Zâmbia
O esquema apresentado é uma iniciativa do Programa de Desenvolvimento do Sector Privado da União Europeia (PDSP) iniciada em Maio de 2001. O total de fundos disponibilizados foi de 2 milhões de US$. O objectivo do esquema era de facilitar o financiamento de pequenas, médias e microempresas (PMME) nos sectores de indústria, agro-indústria e turismo.
Criação do programa
A comissão de acompanhamento do PDSP para o projecto tinha representantes da União Europeia, do Governo e de representantes dos sectores que deveriam participar.
Através de um concurso público, foi seleccionado um agente intermédio para a gestão dos fundos disponibilizados pela União Europeia, a Grant Thornton Associates Limited (GTA). Este agente começou por realizar um inquérito junto das diversas partes que tomavam parte do projecto (bancos, clientes potenciais dos sectores escolhidos) para começar a desenhar as condições de operação do programa. Estas condições foram depois aprovadas pela Comissão de Acompanhamento do PDSP.
A GTA anunciou então um grupo de condições específicas de forma a organizar o processo de selecção dos bancos e instituições financeiras que se deveriam ocupar da actividade de crédito. Nas condições detalhadas para a selecção dos intermediários financeiros incluiam-se :
Figura 13 : Definição de PMME |
Empresa |
Receitas anuais |
Número de empregados |
|
Micro |
>US$ 12,500 |
>9 |
|
Pequena |
US$ 12,500 US$ 125,000 |
10-99 |
|
Média |
US$ 125,000 US$ 2.5 milhões |
100-500 |
Fonte : Grant Thornton Associates |
O processo de selecção conduziu à escolha de 5 instituições financeiras para exercer a actividade de crédito.
Estrutura do esquema de garantia de empréstimos
A estrutura do programa está ilustrada na figura 14. O processo de atribuição dos empréstimos começa com o envio pelas PMME das propostas às instituições financeiras. Estas últimas fazem uma avaliação do risco do projecto, decidem sobre a taxa de juro a praticar, estipulam o período de perdão e exigem certo tipo de garantias. De seguida, submetem a avaliação à GTA que faz uma revisão da proposta para depois se decidir sobre a atribuição de fundos. Para além destes controlos, a GTA tinha assinado um acordo com os bancos incluindo cláusulas que permitissem à GTA controlar o seguimento por parte dos bancos do estabelecido no acordo de crédito (exemplo disso era a exigência de receber as cartas finais com pedidos de crédito assinadas pelos clientes).
Figura 14 : Estrutura do programa na Zâmbia |
Fonte : Grant Thornton Associates
Resultados verificados
Principais observações em relação aos resultados do esquema de crédito na Zâmbia:
Comparação do esquema na Zâmbia com o caso Moçambicano
Neste capítulo foram apresentados elementos comparativos entre os dois casos de esquemas de garantia de empréstimos, cujos pontos essenciais são :
Discussão sobre racionalidade e limitações dos esquemas de garantia de empréstimos
Acesso ao crédito
A razão frequentemente apontada para justificar a existência de esquemas de garantia de empréstimos é a constatação de exclusão financeira ou de dificuldades no acesso ao crédito. Por um lado, o sector bancário não consegue medir bem o risco de crédito para certos agentes e por outro as próprias empresas não conseguem, em algumas situações, dar garantias suficientes.
O sector financeiro tem dificuldades na medição do risco de crédito devido a questões tais como:
A dificuldade das empresas em dar garantias suficientes deriva de:
Para além deste fenómeno, certo tipo de agentes económicos, tais como as PMME poderão ainda sofrer de exclusão financeira devido ao montante reduzido dos empréstimos desejados. De facto, valores muito reduzidos, não compensam os custos incorridos pelos bancos na actividade de crédito. Este problema é normalmente mais acentuado em zonas rurais onde os bancos não estão tão fortemente implantados.
Salientou-se ainda que as dificuldades no acesso ao crédito são agravadas em situações de falta de liquidez no mercado financeiro, como é actualmente o caso em Moçambique e na Zâmbia.
Actuação dos esquemas de garantia de empréstimos
Num cenário de dificuldades no acesso ao crédito, os esquemas de garantia de empréstimos reduzem o risco para os bancos de não-reembolso. Deste efeito espera-se então que se verifique adicionalidade na actividade de crédito. A adicionalidade poderá tomar diferentes formas tais como facilidade de obter empréstimos de montantes maiores, maturidades mais longas, garantias reduzidas, taxas de juro mais baixas ou simplesmente um processamento do pedido de crédito mais rápido.
Um outro efeito, normalmente desejado, no caso de esquemas de garantia de empréstimos é que após a sua implementação, os bancos comecem, por iniciativa própria, a atribuir empréstimos ao grupo de clientes incluído no programa.
Limitações
Nas limitações apontadas a este tipo de esquemas durante a apresentação destacam-se :
Lições para PPP em Moçambique
Em relação aos exemplos referidos de esquemas de garantia de empréstimos, observou-se existir a possibilidade destes terem sucesso no facilitar o acesso ao crédito a grupos-alvo específicos.
Em especial, identificaram-se dois importantes factores de sucesso na construção deste tipo de formas inovadoras de financiamento :
O Dr. Nuno Santos concluiu sugerindo que grande parte do sucesso dos esquemas de garantias de empréstimos descritos tem que ver com as suas estruturas. Cada projecto representa, no fundo, um caso específico de negociação e existem vantagens na montagem de uma PPP na estruturação dos programas.
Sessão 2 Debate |
O debate iniciou-se com uma pergunta do Senhor Austin Muneku sobre os reais benefícios para o desenvolvimento do crédito atribuído no âmbito dos esquemas de garantia de empréstimos em Moçambique e na Zâmbia. Em resposta o Dr. Nuno Santos reconheceu que de facto uma das lacunas neste tipo de projectos consiste na falta de estudos de impacto pormenorizados. Isto é, não se conhecem todos os detalhes dos projectos que foram realizados pelos beneficiários dos créditos. No entanto, estes esquemas permitiram certamente contribuir para o acesso a financiamentos de agentes económicos que à partida estariam excluídos.
De seguida, o Senhor Samuel Chissuco, Presidente da Associação de Produtores Agrários afirmou que o projecto da USAID foi um sucesso, mas desejou saber com mais detalhe as razões das dificuldades encontradas pelos agricultores no acesso ao programa. Sugeriu depois que houvesse um processo de rotação sectorial dos fundos afim de permitir acesso ao crédito aos sectores mais carenciados da agricultura. Em resposta a Dra. Christine de Voest lembrou que o critério utilizado na escolha das empresas no projecto da USAID era simplesmente o de estas terem sido lesadas pelas cheias. Acrescentou que era da competência do sector bancário, após análise de crédito, a escolha dos beneficiários independentemente do seu sector de actividade. Desta forma a alocação dos fundos ficou dependente da eficiência e condicionalismos dos bancos participantes. No entanto os resultados do programa mostram que o sector agrícola não foi totalmente excluído. De seguida explicou que teria sido muito dificil satisfazer todos os interessados em todos os sectores de actividade e simultâneamente conseguir desembolsar US$ 25 milhões num tão curto espaço de tempo. Finalmente quanto à sugestão da rotação sectorial a Dra. Christine de Voest disse que esse não era o conceito deste programa especifico. No entanto, não excluiu a possibilidade da USAID constituir programas direccionados ao desenvolvimento rural que necessariamente iriam envolver uma nova negociação e o estabelecimento de novas PPP.
O Senhor Austin Muneku voltou a intervir perguntando quais as razões da escolha dos sectores indústria, agro-indústria e turismo para o programa da Zâmbia. O Dr. Nuno Santos respondeu que se tratou de uma escolha baseada no resultado de um estudo previamente elaborado e que identificou estes sectores como sendo os de maior potencial de crescimento nos esforços de diversificação da economia zambiana.
A senhora Katie Kampmann do Center for International Private Enterprise perguntou se não seria de utilizar as associações de agricultores para ajudar as instituições de crédito rural na análise de risco dado o bom conhecimento que têm dos seus associados. A Dra. Christine de Voest e o Dr. Nuno Santos concordaram que a questão era pertinente porque um tal sistema permitiria em teoria reduzir as assimetrias de informação que limitam o acesso por parte dos agricultores ao crédito bancário. Concluiram que um esquema utilizando não só as associações como também as empresas agrícolas poderia constituir a base de uma nova forma de financiamento do mundo rural.
Sessão 3 |
Dois casos de actividade económica em Moçambique:
algodão e cajú
Estes casos foram escolhidos para ilustrar a necessidade de melhorar a base de conhecimentos da economia com o objectivo de encontrar soluções mais eficientes e equitativas para os problemas. Ambos são casos referentes ao sector agrícola dada a importância económica e social deste sector em Moçambique.
Com efeito, o país possui cerca de 36 milhões de hectares de terra arável, dos quais, só cerca de 5 milhões são actualmente cultivados. A estrutura económica mais comum no sector agrícola é o agregado familiar, produzindo para consumo, com tecnologia muito rudimentar. Cerca de 80% da população moçambicana está envolvida na agricultura. A área média cultivada por família é de 2.4 hectares estando disponíveis 12 hectares de terra por família no País. Apenas 9% dos agregados familiares usam algum equipamento, 7% usam tractor ou tracção animal e 2% fertilizantes ou pesticidas. O crescimento da produção agrícola tem sido feito na base do acréscimo da produção de alimentos, sendo necessário desenvolver outras alternativas que se enquadrem no sistema de produção familiar, como a produção de culturas de rendimento para exportação.
O sub-sector algodoeiro em Moçambique cobre cerca de 1.500.000 pessoas (cerca de 8 % da população total do país). No sub-sector do cajú cerca de 1.000.000 de pequenos produtores beneficiam dos rendimentos da produção e as fábricas de processamento em plena laboração representavam cerca de 10.000 postos de trabalho antes da introdução da política de liberalização da comercialização das castanha de caju em bruto a partir de 1995.
Parte 1
: O Algodãoapresentado pelo Eng. Carlos Henriques, ex-Presidente da Associação Algodoeira de Moçambique.
O conteúdo desta apresentação incluiu :
Caracterização geral da cultura do algodão
O algodão é uma cultura produzida em mais de 80 países, com uma produção mundial anual em redor dos 20 milhões de toneladas de fibra. É uma das mais importantes culturas de rendimento e tem um forte peso nas economias dos países em desenvolvimento onde é praticada. A produção algodoeira é ideal para o sector familiar, sendo cultivada com sucesso em países em desenvolvimento, como a Índia, Paquistão e países de África, contribuindo decisivamente para a melhoria da economia camponesa. No contexto da economia mundial verifica-se que o consumo de fibra tem aumentado 1.2 % ao ano. A produção de fibra é resultante de dois factores: área semeada e rendimento. A tendência geral a nível mundial é de diminuir as áreas cultivadas pela via do aumento dos rendimentos.
Em Moçambique o algodão é uma das poucas culturas com garantia de mercado para o camponês produtor, dado que as empresas de fomento garantem a sua compra no final da campanha. Contudo, ao contrário da tendência mundial, o aumento da produção é ainda hoje feito pela via do aumento das áreas semeadas no sector familiar em detrimento do aumento do rendimento por área semeada. Com a privatização do sub-sector algodoeiro iniciada em 1991, a produção de algodão caroço cresceu rapidamente, tendo passado de 50 500 tons em 1996, para 116 000 tons em 1999. Baixou depois para 35 000 tons em 2002. O algodão ocupa o 4O ou 5O lugar (dependendo do ano) nos produtos de exportação de Moçambique.
A evolução do preço internacional do algodão
A queda do preço internacional do algodão foi apontada como uma das principais causas das dificuldades enfrentadas pelo sub-sector algodoeiro moçambicano. De facto, entre 1995 e 2001, o preço variou de 118 a 35 cêntimos de US$ por libra peso (Figura 15).
Figura 15 : Evolução do preço mundial da fibra de algodão (centimos de US$ por libra) |
Fonte : M. Fok / CIRAD
Foram indicadas várias razões que explicam esta evolução, nomeadamente :
|
Fonte : M. Fok / CIRAD
Figura 17 : Subsídios à produção de algodão (milhões de US$) |
País |
Ano |
|
1998 |
1999 |
|
Brasil |
521 |
622 |
China |
4,501 |
3,830 |
Egipto |
230 |
229 |
Espanha |
104 |
125 |
EUA |
3,030 |
3,964 |
Grécia |
390 |
428 |
México |
219 |
137 |
Turquia |
882 |
795 |
Total |
9,877 |
9,860 |
Fonte : M. Fok / CIRAD |
Definição de uma Política agrícola
A agricultura deve ser uma componente significativa da política de desenvolvimento económico do País. Ao investir na modernização da agricultura através da introdução e disseminação de novas tecnologias, quer referentes às culturas alimentares, quer às de rendimento, toda a população beneficiará e em particular os mais pobres e desfavorecidos. É ainda necessário estimular a formação, melhorar as infraestruturas rurais, o conhecimento e funcionamento dos mercados.
Em termos de definição de uma Política agrícola, alguns dos problemas que foram apresentados para o caso de Moçambique dizem respeito a :
Constrangimentos gerais que afectam as empresas algodoeiras
Sem se pretender ser exaustivo, foram apresentados alguns dos constrangimentos que afectam a capacidade das empresas algodoeiras moçambicanas de serem mais eficientes e competitivas internacionalmente :
Conclusões
O Eng. Carlos Henriques concluiu a sua apresentação salientando que:
Parte 2
: O Cajúapresentado pelo Senhor Kekobad Patel, Presidente da AICAJU - Associação dos Industriais do Cajú de Moçambique.
O conteúdo desta apresentação incluiu :
A caracterização do cajú na economia moçambicana
A importância do cajú na economia de Moçambique
O Senhor Kekobad Patel resumiu a importância do cajú na economia moçambicana através dos seguintes dados :
A evolução da produção de cajú em Moçambique
|
Fonte : Aicaju
Moçambique era nos anos 60 o líder mundial na produção de castanha de cajú e o sucesso inicial obtido conduziu também à industrialização do sub-sector. De facto, Moçambique foi o primeiro país africano a processar castanha de cajú numa escala industrial à medida que pequenos e médios sistemas de processamento foram sendo substituídos por grandes fábricas mecanizadas. O processamento da castanha de cajú atingiu o seu pico em 1973 quando aproximadamente 150,000 toneladas foram transformadas (figura 18). Após a independência de Moçambique, a produção entrou num longo período de declínio que se agravou com a guerra civil. Por outro lado, a produção mundial continuou a aumentar e por volta de 1989/90, a produção moçambicana não passava de 5% do total mundial.
O declínio também afectou as exportações de castanha processada e numa tentativa de contrariar esta tendência, o Governo moçambicano proibiu em 1978 as exportações de castanha não processada (figura 19).
Figura 19 : Evolução das exportações de castanha em bruto em Moçambique (toneladas) |
Fonte : Aicaju
A liberalização da comercialização da castanha de cajú
As reformas do sector nos anos 90
Na sequência da alteração do sistema económico em Moçambique e a adesão do país ao Fundo Monetário Internacional e ao Banco Mundial foram levadas a cabo reformas significativas no sub-sector do cajú tais como :
A primeira reforma foi aplaudida pela classe empresarial moçambicana. Já quanto à segunda houve uma forte contestação dos industriais e dos sindicatos do sub-sector aos pressupostos em que os consultores do Banco Mundial se basearam para recomendar ao Governo a referida reforma e das consequentes vantagens que viam nela para Moçambique. Esses pressupostos eram os seguintes :
O resultado prático da liberalização da comercialização da castanha de cajú
O Senhor Kekobad Patel começou por afirmar que as suas conclusões sobre este ponto eram consistentes com as de uma publicação conjunta intitulada « When economic reform goes wrong : cashew nuts in Mozambique » (vêr página seguinte) e que passou a indicar :
Sumário do estudo « When economic reform goes wrong : cashew nuts in Mozambique » NBER Working Paper 9117 de Margaret McMillan da Universidade de Tuffts, Dani Rodrik da Universidade de Harvard e Karen Horn Welch da Universidade de Stanford:
Mozambique liberalizou o sub-sector do cajú no início dos anos 90 em resposta à pressão exercida pelo Banco Mundial. Os opositores a esta reforma argumentaram que a política pouco beneficiaria os pobres agricultores de cajú e simultaneamente levariam à falência as fábricas nas áreas urbanas. Usando uma abordagem de teoria do bem-estar os autores analisaram os dados disponíveis e forneceram uma quantificação das consequências da reforma em termos de distribuição de rendimentos e eficiência. Estimaram que os benefícios directos resultantes da redução de restrições às exportações de castanha de cajú foram da ordem de US$ 6.6 milhões anualmente ou cerca de 0.14% do PIB de Moçambique. Contudo estes benefícios foram largamente anulados pelos custos do desemprego provocados nas áreas urbanas. O ganho líquido para os agricultores foi provavelmente inferior a US$ 5.3 milhões ou seja US$ 5.3 por ano por agregado familiar produtor de cajú. Uma atenção inadequada à estrutura económica e à economia política parece contar para estes resultados desapontadores. |
A este respeito, o Senhor Patel lembrou que a AICAJU em 1995 tinha publicado um documento intitulado « O futuro do sector do cajú em Moçambique » onde expressamente antecipava as consequências da liberalização agora confirmadas pelos resultados práticos desastrosos a que aquela reforma conduziu este sub-sector e dos quais indicou os seguintes :
Moçambique, que era conhecido nos Estados Unidos da América, Europa, Médio Oriente e Extremo Oriente, como um dos principais fornecedores de amêndoa de cajú, desapareceu do mercado.
Conclusões sobre o futuro do cajú em Moçambique
O Senhor Patel concluiu a sua apresentação afirmando que o futuro do cajú em Moçambique passa pela elaboração de uma politica de defesa do interesse nacional moçambicano numa perspectiva de desenvolvimento sustentável e harmonioso do país.
Nesse sentido defendeu a elaboração de um plano director de desenvolvimento que contemple, entre outros, os seguintes aspectos :
Sessão 3 - Comentários |
Algodão
comentado pelo Dr. António Almeida Matos, Presidente do Conselho de Administração da Sociedade Austral de Desenvolvimento
Os principais comentários feitos foram os seguintes :
Cajú
comentado pelo Dr. António Carvalho Neves da Deloitte & Touche/Moçambique
Os principais comentários feitos podem resumir-se da seguinte forma :
Sessão 3 - Debate |
O debate iniciou-se com a resposta do Eng. Carlos Henriques à questão de saber o que fazer para alterar a actual crise que o sub-sector do algodão vive.
Foi indicado pelo orador que existem duas medidas importantes de carácter estrutural a implementar com urgência. Por um lado, o desenvolvimento da investigação aplicada e por outro, o fornecimento às empresas algodoeiras de factores de produção subsidiados. Deu como exemplo deste último o aproveitamento dos mecanismos da cooperação Japonesa que já foram aplicados em Moçambique à semelhança do que aquele país asiático continua a fazer em outros países africanos. Referiu ainda o impacto altamente negativo para os agricultores moçambicanos dos subsídios atribuídos pelos Governos dos países desenvolvidos aos seus agricultores. Indicou que, caso os EUA deixassem de subsidiar os seus agricultores, o preço internacional do algodão subiria 12 centimos de US$ por libra/peso ou seja um aumento de cerca de 25%. Salientou ainda que em termos da competitividade do sub-sector do algodão em Moçambique, esta situa-se a níveis próximos dos da África Ocidental, i.e. com custos de produção de aproximadamente 50 cêntimos de US$ por libra/peso o que é manifestamente inferior ao custo nos EUA que se situa à volta de 70 cêntimos de US$ por libra/peso. Referindo-se ao comentário do Dr. António Almeida Matos em relação à falta de competitividade geral da economia moçambicana, nomeadamente face à África do Sul, o Eng. Carlos Henriques lembrou o que já afirmara na sua apresentação sobre a exorbitância dos custos de transporte e energia em Moçambique se comparados com os da África do Sul.
A propósito dos subsídios agrícolas aos produtores dos países desenvolvidos, S.E o Ministro Carlos Morgado, manifestou a opinião que, se os Governos dos países desenvolvidos subsidiam os seus produtores, então poderiam também contribuir para subsidiar a agricultura moçambicana através dos seus programas de cooperação com Moçambique. Seguiu-se um comentário do Dr. Nuno Santos, mencionando as grandes perdas de receitas de exportação causadas pela queda dos preços mundiais do algodão nos últimos dois anos (constantes no estudo : Improving Market Access : Toward Greater Coherence Between Aid and Trade by IMF staff
). Estas perdas alcançaram, segundo estimativas do FMI, valores de mais de 3% do PIB no Mali e Benin e 1 a 2% do PIB no Burkina Faso e no Tchad. Para se ter uma dimensão destas perdas, o Dr. Nuno Santos comparou-as ao valor anual da iniciativa HIPC para o alívio do serviço da dívida daqueles países que foi num intervalo de 0.8% a 1.6% do PIB em 2001 segundo dados do FMI. O Dr. Francisco Mantero lembrou que nos termos da Declaração de Doha (OMC) foi reconhecida a especificidade da agricultura dos países em desenvolvimento podendo estes beneficiar de tratamentos especiais e diferenciados para os seus produtos agrícolas. Nesse âmbito sugeriu que Moçambique se aliasse aos países produtores de algodão da África Ocidental numa estratégia comum para a melhor defesa dos seus interesses. Salientou ainda o facto de existirem fundos na própria OMC para financiar a assistência técnica que esses países eventualmente necessitem para apoiar as suas posições nas negociações.O Sr. Samuel Chissuco, Presidente da Associação de Produtores Agrários desejou saber qual a estratégia actual para aumentar a produção de cajú no país.
O Sr. Kekobad Patel respondeu que quanto a este aspecto está aprovado um plano director, o qual está no terceiro ano de implementação sem praticamente se ter procedido a replantio. De acordo com este plano, cerca de 95% dos recursos são aplicados na fumigação das árvores existentes, sendo os 5% restantes investidos no replantio. O financiamento dos custos com a fumigação assenta numa sobretaxa aplicada à castanha de cajú o que o Sr. Patel considerou um erro. De facto, esta sobretaxa varia de acordo com os preços da castanha de cajú o que num período de baixa constante dos preços (como é o caso presente), afecta os recursos financeiros para a reabilitação da produção, prejudicando deste modo o objectivo final de aumentar a mesma. Sugeriu também que no plano actual, em vez da prioridade dada à fumigação, se deveria privilegiar o investimento em novos cajoeiros, bem como estudar o impacto ecológico da fumigação. O Sr. Patel terminou afirmando, que tendo o Banco Mundial sido responsável da situação actual do sub-sector, deveria disponibilizar recursos para o financiamento deste plano.
Seguiu-se um comentário de S.E o Ministro Carlos Morgado que (i) reconheceu que foram tomadas algumas medidas com precipitação, (ii) que conviria que o Comité do Cajú produzisse uma posição coerente sobre o assunto, após o que (iii) defendeu o direito de opção de compra por parte dos industriais nacionais de cajú para exportação e (iv) a criação de mecanismos para proteger a indústria moçambicana de cajú.
Concluiu então o Dr. Mário Machungo sugerindo que toda esta problemática necessitaria um debate mais profundo e alargado, não sendo porém possível continuar dado o adiantado da hora.
Sessão de encerramento |
Encerrou a conferência S.E. o Ministro da Indústria e Comércio, tendo salientado na sua intervenção os seguintes aspectos:
Finalmente, defendeu a importância de uma PPP em Moçambique baseada na competência e responsabilidade, solicitando à OCDE que continue a apoiar Moçambique neste sentido.
Trabalhos preparatórios e pós conferência |
O início do projecto
O projecto piloto Parceria público-privada em Moçambique (PPP MOZ) enquadra-se no âmbito do Programa Lusófono do Centro de Desenvolvimento da OCDE (DEV) para 2002, Programa lançado por iniciativa do Brasil e aprovado pela Comissão Consultiva do DEV. O projecto contou com os apoios da Agência Portuguesa para Apoio ao Desenvolvimento e o Instituto de Investigação Científica Tropical de Portugal e, nesta fase, culminou com a organização de uma conferência realizada no dia 1 de Outubro de 2002 em Maputo intitulada "Parceria público-privada em Moçambique". Localmente a conferência teve o patrocínio da Cooperação Suiça, do Banco Internacional de Moçambique e das empresas British American Tobacco e Delta Cafés.
Este projecto piloto começou com a aceitação em Maio de 2001 do Dr. Mário Machungo, ex-Primeiro-Ministro de Moçambique e actualmente Presidente do Conselho de Administração do maior banco privado moçambicano, em integrar e presidir à Comissão de Acompanhamento do PPP MOZ, tendo-se seguido em Agosto de 2001 uma missão do DEV a Moçambique chefiada pelo seu Presidente, o Professor Jorge Braga de Macedo, também membro da referida Comissão de Acompanhamento que integra ainda: o Eng. Carlos Simbine, Presidente da Associação Industrial de Mocambique (AIMO), o Eng. José Viegas, Presidente do Conselho de Administração das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), o Dr. Francisco Mantero, Presidente do Conselho de Administração da Agrimo-Companhia Agro-Pecuária de Moçambique, Lda., o Dr. Vitor Peixoto, Director-Geral da Delta Cafés em Moçambique e o Dr. Elísio Langa do Banco Internacional de Moçambique, como Secretário Executivo.
Simultâneamente criou-se uma Comissão de Avaliação presidida por S. Exa. o Ministro da Indústria e Comércio de Moçambique, Eng. Carlos Morgado e da qual fazem parte o Dr. Egas Mussanhane, Presidente da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) e o Senhor Joaquim Fanheiro, Presidente da Organização dos Trabalhadores Moçambicanos (OTM).
Organização da conferência
Em 3 de Junho de 2002, o Dr. Francisco Mantero iniciou no DEV os trabalhos preparatórios para a referida conferência, tendo-de mantido em Paris até 8 de Setembro para o efeito. Após reuniões em Lisboa com o Professor Roberto Tibana na semana de 9 a 13 de Setembro, deslocou-se para Maputo em 18 de Setembro, tendo regressado ao DEV a 4 de Outubro para preparar a primeira versão em lingua inglesa do relatório, que foi concluída a 31 de Outubro. Desde 10 de Julho contou com a colaboracão do Dr. Nuno Santos, o qual o acompanhou em Maputo de 25 de Setembro a 2 de Outubro e apresentou uma comunicação na sessão da conferência sobre formas inovadoras de financiamento.
Durante a sua estadia no DEV, para além de ter executado todos os trabalhos e diligências necessárias à concepção, preparação e implementação da referida conferência, o Dr. Francisco Mantero manteve, ao nível da OCDE, inúmeros contactos e reuniões com o Secretário-Geral do Business and Industry Advisory Committee to the OECD (BIAC), Senhor Douglas Worth, o Secretário-Geral do Trade Union Advisory Committee to the OECD (TUAC), Senhor John Evans, e encontros com o Senhor Eric Burgeat, Director, Centre for Co-operation with Non-Members que estava acompanhado da Senhora Marilyn Yakowitz, Head , South America, Brazil, Baltics and Exploratory Programmes, Sustainable Development and Knowledge Economy, a Senhora Alexandra Trzeciak-Duval, Head of Division for Agricultural Policies in Non-Member Economies, Directorate for Food, Agriculture and Fisheries que estava acompanhada pela Senhora Olga Melyukina e o Senhor Brendan Gillespie, Head of Division for Co-operation with European Economies in transition and Non-Member Countries que estava acompanhado pelo Senhor Peter Borkey. No DEV trabalhou várias vezes com o Senhor Henri-Bernard Solignac-Lecomte, DEVs Economist/Analyst of Civil Society, Policy Dialogue and External Co-operation Unit. Reuniu ainda com o Senhor Sérgio Pereira Leite, Director-Adjunto do escritório de Paris do FMI e o Economista Senior daquele escritório, Senhor Graeme Justice, tendo estado nesta reunião acompanhado pelo Dr. Nuno Santos. Encontrou-se também com o Senhor Jean-Louis Castelneau, Presidente Delegado do Conseil Français des Investisseurs en Afrique (CIAN) e actual Presidente do Business Council Europe-Africa-Mediterranean (BCEAM). Manteve ainda contactos com os Senhores Darius Mans, Worlds Bank Country Director for Mozambique, Ibrahim Elbadawi, World Banks Lead Economist and Manager, Regional Program for Enterprise Development, John Nasir, World Banks Economist, Private Sector Development, Africa Region , John Sullivan, Executive Director, Center for International Private Enterprise, US Chamber of Commerce, John Simon, Deputy Assistant Administrator, Bureau for Policy and Program Coordination, USAID, Alhaji Bamanga Tukur e Chris Onyemenam, respectivamente Presidente e Primeiro-Secretário da African Business Round Table, organização membro do NEPAD Business Group. Teve também a oportunidade de se encontrar com o Professor Wiseman Nkuhlu, Secretário-Geral do NEPAD durante a sua visita oficial à OCDE. Para efeitos da obtenção de dados para preparação da apresentação sobre o esquema de garantias de empréstimos na Zâmbia, o Dr. Nuno Santos contou com informações iniciais da Dra. Lucia Wegner (DEV) e mais tarde com detalhes gentilmente fornecidos pelo Senhor Henry Ngaba da Grant Thornton Associates.
Em Moçambique, previamente à conferência, o Dr. Francisco Mantero, participou em várias reuniões da Comissão de Acompanhamento relativas à respectiva organização, bem como manteve contactos com representantes do sector privado moçambicano e investidores estrangeiros no país. Reuniu ainda com todos os apresentadores e comentadores.
Eventos pós conferência
No seguimento da conferência, os Professores Jorge Braga de Macedo e Roberto Tibana deram conta da mesma ao Pimeiro Ministro de Moçambique, impedido de participar na conferência à última hora.
Em reunião da Comissão de Acompanhamento foi decidido sediar o ICAE na Associação Industrial de Moçambique (AIMO) e proceder a acções de divulgação no país, tendo-se para tal obtido financiamento do Instituto de Investigação Científica Tropical de Portugal (IICT). O DEV irá também financiar uma nota mensal sobre a conjuntura realizada pelo Professor Roberto Tibana e quatro actualizações do ICAE, que serão disponibilizadas nas páginas web do DEV, da AIMO e do Professor Roberto Tibana. Foi acordado com o Vice-Governador do Banco de Moçambique que o Professor Roberto Tibana faria uma apresentação do ICAE num seminário a realizar naquele Banco Central. A sequência deste projecto prevê ainda a elaboração de um modelo econométrico baseado naquele que é utilizado no AEO.
A conferência recebeu bastante atenção por parte dos principais meios de comunicação social moçambicanos e teve ampla divulgação na Televisão (TVM e RTP África), Rádio Moçambique e jornais (Notícias e Savana). Após o termo da mesma foi efectuada uma conferência de imprensa com o Dr. Mário Machungo e o Professor Braga de Macedo.
Participantes e outros parceiros
Participaram 107 pessoas.
Por parte do Governo de Moçambique estiveram presentes S. E. o Ministro da Indústria e Comércio, Eng. Carlos Morgado, que em nome do Primeiro-Ministro abriu a conferência e fez o discurso de encerramento e S. E. o Ministro dos Recursos Naturais e Energia, Dr. Castigo Langa.
Em representação da Assembleia da República de Moçambique esteve a deputada Dra. Virginia Videira.
Igualmente estiveram presentes o Vice-Governador do Banco de Moçambique, Dr. Ernesto Gove, e altos funcionários daquele Banco Central, bem como altos funcionários dos Ministérios das Finanças e Plano, Transportes, Agricultura e Desenvolvimento Rural, Indústria e Comércio e Recursos Naturais e Energia.
Do corpo diplomático acreditado em Maputo participaram S.E. os Embaixadores da África do Sul, França, India, Maurícias e Estados Unidos da América e representantes das Embaixadas da Austria, Bélgica, Cabo Verde, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos da América, França, Portugal e Suiça, bem como representantes da Agência Francesa de Desenvolvimento, da Cooperação Belga, da Cooperação Portuguesa, da Cooperação Suiça, do PNUD , da UNECA e da USAID. O Banco Mundial informou não ter podido participar por ainda não ter concluido a actualização do inquérito industrial realizado de Moçambique realizado em 1999 mas disponibilizará à Associação Inustrial de Moçambique, onde ficou depositado o ICAE, a base de dados daquela actualização. No contexto da conferência, o Professor Jorge Braga de Macedo e o Dr. Francisco Mantero reuniram com o economista sénior da delegação do Banco Mundial em Maputo, Dr. Dipac Jaiantilal.
Presentes ainda o Senhor Nazim Ahmad, Presidente da Fundação Aga Khan, a Senhora Katie Kampmann, Program Officer, Africa, do Center for International Private Enterprise de Washington, D.C., todos os membros da Comissão de Acompanhamento do PPP MOZ, bem como representantes de inúmeras empresas do sector privado , bancos e sindicatos, nomeadamente o representante do TUAC, o Senhor Austin Muneku da Zambia Congress of Trade Unions, jornalistas , economistas e consultores, nomeadamente o consultor da Universidade de Harvard, Dr. António Franco.
Durante a preparação da conferência, na sequência das reuniões havidas com o Secretário-Geral do TUAC, este entregou ao PPP MOZ exemplares dos seguintes documentos daquela organização: "The OECD guidelines on multinationals", "Fashioning a New Deal/Workers and Trade Unions at the World Summit for Sustainable Development" e "Trade Union Statement to the 2002 OECD Council at Ministerial Level and to the Kananaskis G8 Economic Summit".
O BIAC não pode fazer-se representar, embora tenha participado activamente na preparação da conferência através de contribuições do seu Secretário-Geral, que forneceu ao PPP MOZ um exemplar do documento produzido por aquela instituição intitulado "Innovation and global sustainable growth".
A DCD Development Co-operation Directorate da OCDE através do Senhor Hunter McGill, Head of Division, Peer Reviews, informou o DEV por e-mail do dia 27 de Setembro de 2002 sobre a avaliação realizada em 2001 referente a programas e políticas de três doadores em Moçambique. Os resultados dessa avaliação estão publicados no Development Cooperation Journal, 2001, Volume 2, Nr 4. Informou também que a OCDE acabou de publicar um estudo sobre o investimento directo estrangeiro no desenvolvimento ("FDI for Development: Maximising Benefits, Minimising Costs"), o qual entre outros pontos, refere que é essencial para o país beneficiário do investimento estrangeiro criar um ambiente de transparência e respeito pela Lei. O Senhor Hunter McGill acrecentou ainda no seu e-mail que lhe parecia ser essencial que a conferência cobrisse a questão da corrupção caso Moçambique quizesse beneficiar de investimento directo estrangeiro e atrair parcerias público-privadas.
Referências |
Badiane O, Ghura D, Goreux L e Masson P, Julho 2002, "Cotton sector strategies in West and Central Africa", World Bank Policy Research Working Paper 2867
BIAC/OECD, Maio 2001, "Innovation and Global Sustainable Growth", BIAC Discussion Paper
Braga de Macedo, Jorge, Outubro 2002, "African Economic Outlook", Apresentação na conferência PPP MOZ realizada em Maputo
De Voest, Christine, Outubro 2002, "ER/ACT Recuperação Económica das cheias", Apresentação na conferência PPP MOZ realizada em Maputo
Fok, Michel, Junho 2002, "Intégration de lagriculture dans les négociations internationales de lOMC: comment saisir les opportunités offertes pour les filières cotonnières", CIRAD Montpellier
Global Unions, 2002, "Fashioning a New Deal: Workers and Trade Unions at the World Summit for Sustainable Development", Trade Union Document-2002 WSSSD
Henriques, Carlos, Outubro 2002, "O Algodão", Apresentação na conferência PPP MOZ realizada em Maputo
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McMillan M, Rodrik D e Horn Welsh Ksson, Agosto 2002, "When Economic Reform Goes Wrong: Cashews in Mozambique", NBER Working Paper 9117 (http://www.nber.org/papers/w9117)
Patel, Kekobad, Outubro 2002, "O Cajú", Apresentação na conferência PPP MOZ realizada em Maputo
Santos, Nuno, Outubro 2002, "Esquema de garantia de empréstimos na Zâmbia", Apresentação na conferência PPP MOZ realizada em Maputo
TUAC/OECD, 2002, "OECD Guidelines on Multinationals", TUAC
TUAC/OECD, 2002, "Trade union statement to the 2002 OECD council at ministerial level and ti the Kananaskis G8 economic summit", TUAC
Van Oyen, Leny e Levitsky, Jacob, 1999, "Financing of Private Enterprise Development in Africa", United Nations Industrial Development Organization Working Paper N 4
Winters, Alan L. e McGrew, Anthony, Junho 2001 "Making Globalization Work for the Poor the European Contribution / The Need for Coherence", Informal high-level consultation arranged by the Swedish Presidency of the Council of the European Union, Kramsford, Sweden