Economia Suave
Regras em vez de Arbítrio
Jorge Braga de Macedo
Ensina-se ao economista a desconfiar das promessas do governo (ou de uma
empresa dominante). Mas não é porque governantes (ou empresários) que prometem
sejam maus ou estúpidos. Tem antes a ver com a sua credibilidade, em termos que
os prémio Nobel Ed Prescott e Finn Kydland dilucidaram há muitos anos.
Para uma decisão representar o “controle óptimo”, um termo que migrou da investigação operacional para a economia durante os anos sessenta, o dirigente (que se presume bondoso e bem informado) selecciona a melhor decisão - dadas as circunstâncias presentes e o critério de selecção. Graças à estimação de modelos “controláveis”, chegou-se a prever a convergência dos sistemas capitalista e soviético: a informação estava disponível, bastava computar!
Tudo mudou quando Robert Lucas (prémio Nobel em 1995) duvidou que a escolha
da regra óptima pudesse ser independente da informação económica que lhe deu
origem. A crítica de Lucas implica
que alterações nas políticas induzem alterações na estrutura das séries, que
exigem novas estimativas e assim por diante, sem garantia de solução estável,
quanto mais de solução óptima.
A consequência foi tirada pelos dois discípulos que receberam o prémio
Nobel em 2004, os quais demonstraram a inconsistência dos planos óptimos no seu
célebre “Regras em vez de Arbítrio”. Melhor, a regra consistente (ou seja a
melhor decisão dadas as circunstâncias presentes e dado que o critério de
selecção irá ser o mesmo no futuro) só será óptima se existirem mecanismos que
induzam os decisores futuros
a ter em conta o efeito da mesma regra, por via das expectativas nas decisões presentes
dos agentes.
Vale lembrar aqui que as expectativas, através das quais se formam as visões sobre o futuro, sempre estiveram subjacentes à análise económica e há muitos trechos clássicos sobre o efeito das expectativas nos ciclos económicos. O próprio Keynes salientou com grande insistência o seu efeito determinante no investimento. Ora também afectam o consumo das famílias, e cada vez mais.
Assim, quem espera mais impostos sobre o seu capital no futuro, poupa menos
no presente, porque o preço do consumo presente diminui relativamente ao
consumo futuro. Do mesmo modo, se as pessoas esperam uma política monetária
expansionista e inflação mais alta, irão apresentar preços e exigir salários
também mais altos. Expectativas (racionais) de tais políticas futuras
diminuem a credibilidade dos governantes presentes.
Daqui também resultam implicações para as empresas dominantes mas Kydkand e
Prescott afirmam antes de concluir o seu artigo de 1977 (um ano depois da crítica
de Lucas) que será racional para uma maioria de trabalhadores que controlem
o governo limitar o seu próprio poder de expropriar a riqueza de uma classe
capitalista dotada de uma taxa de desconto inferior (ou seja, mais paciência).
Sabendo que não vão ser expropriados no futuro, irão poupar mais - o que tende a aumentar o salário e promove o bem comum.
Bem comum que a economista amigo lembrou um livro escrito para “os capitães
de Portugal” se verem nele “a si mesmos e suas valorosas acções, como em
espelho, para que com estas cópias de morte-cor diante dos olhos, retratem por
elas vivamente os originais, antevendo o que hão-de-obrar, para que o obrem, e o
que hão-de ser, para que o sejam”. Já em 1718 a História do Futuro do
Padre António Vieira tentava educar os dirigentes portugueses através do
equivalente moral das expectativas (racionais).