Redescobrir Portugal
Portugal precisa de redescobrir-se – através de um saber de experiência
feito. Tarefa permanente de todos os residentes no território nacional e de
todos os portugueses e luso-descendentes que, pelo mundo fora, aliam à memória
uma esperança no futuro. Tarefa até de tantos outros povos a que nos unem laços
de proximidade histórica, geográfica, económica, social ou cultural. Não sendo
apenas dos eleitores que designam os seus representantes no parlamento e que
elegem o chefe do Estado, esta tarefa de ir redescobrindo a identidade nacional
cabe-nos contudo em primeira mão.
Por outras palavras, o voto concretiza uma dimensão vital da redescoberta,
mas não pode descarnar-se nem do passado comum nem de uma perspectiva de
futuro. Nestes tempos incertos, um presidente que perceba a governação mundial
por dentro pode alavancar a maioria parlamentar. Um presidente que saiba
recolher o melhor das experiências estrangeiras, europeias ou não, pode
explicar os desafios a todos quantos se interessam pelo nosso destino
histórico.
O equilíbrio entre democracia e mercado, por exemplo, assenta em mecanismos
de cooperação intertemporal que vão ao mais alto nível do Estado. A longevidade
crescente das pessoas torna tais mecanismos de cooperação intertemporal essenciais
para sustentar quaisquer reformas, mesmo que sejam da competência estrita do
governo ou do parlamento.
Não são só os tribunais, é a própria administração, são as empresas, é a
própria sociedade civil que tem de criar e sustentar tais mecanismos, sabendo
atrair e reter a criatividade e a excelência. Um presidente credível ajuda a
redescobrirmos Portugal maior no espaço e no tempo.
Só um candidato mostra que percebe e respeita as instituições que promovem
os mecanismos de cooperação intertemporal que sustentam aquela redescoberta. É
dessas instituições e da sua interacções com entidades públicas e privadas que
resulta a boa governação. E sem boa governação – no sentido mais amplo –
estagna a actividade económica, corrói-se a coesão social e definha a própria
cultura.
A marca da boa governação em Portugal resultará ainda do modo como o
presidente apreender na prática a experiência
histórica contemporânea (para citar o subtítulo de um livro de homenagem a
Jorge Borges de Macedo editado pelo Instituto Diplomático). O saudoso
historiador e pedagogo cita aí o apelo do primeiro-ministro em 17 de Agosto de
1987 para “o sentido nacional que afirmámos noutras horas determinantes da
nossa história”. Apelo que fez Portugal maior no espaço e no tempo e ao qual,
mudados os tempos e as vontades, há que responder a 22 de Janeiro.
P. S. Por sinal, o último artigo da coluna Estrelas e Quinas que assinei no Diário
de Notícias, intitulado “Os candidatos e o mercado”, apareceu em 2 de
Janeiro de 1996, advogando: “há desafios nacionais que, casando democracia e
mercado devem ser entendidos ao mais alto nível do Estado”. Volto ao mesmo
jornal com a mesma mensagem, e mais dez anos de argumentos.
Jorge Braga de Macedo